Foi sepultado em Mossoró/RN o poeta repentista e cordelista Luiz Antônio. No site "Queima-bucha", dedicado à Literatura de Cordel, o presidente da FUNDAÇÃO JOSÉ AUGUSTO Joaquim Crispiniano Neto escreveu o artigo que transcrevemos:
Mais um poeta vai compor o coro dos cantadores no céu. Desta vez é o poeta Luiz Antônio que se distancia, até quando for chegando a vez de cada um de nós também mudar de andar. Luiz Antônio era paraibano, mas se fez mossoroense há muitos anos. No final da década de 70 ele chegou para morar em Mossoró. Nascido em Desterro de Malta na Paraíba, tinha morado em vários lugares, como é comum aos cantadores. Um problema de ordem pessoal o fez mudar-se de Crateús para Caicó e depois para Mossoró, onde nos fizemos muito amigos, na luta pela defesa dos direitos dos poetas e pela divulgação da cantoria e da literatura de cordel. Conheci-o num festival de violeiros que Aldivan Honorato promoveu no antigo Parque de Exposições da Esam, por volta de 1977. Cantava com Chico Mota. Vi logo seu talento e seu capricho com as regras da poesia popular nordestina. Luiz Antônio veio e se instalou em Mossoró, cantando em várias emissoras de rádio e participando de todas as nossas lutas em prol da poesia e também em prol da redemocratização do país, pois naqueles tempos um grupo de jovens poetas, composto por nós, por Antônio Lisboa, Francisco de Assis, Concriz, Damião da Silva e João Preá, que depois veio a ser o João Lourenço, resolvemos cantar política, levando a mensagem de esquerda, dos movimentos sociais, a denúncia da ditadura militar e da exploração dos trabalhadores. Luiz Antônio era bem mais velho e funcionou como uma espécie de mestre ao lado de Luiz Campos, nos corrigindo nas técnicas da versificação cordeliana, exigente como sempre foi na rima, na métrica, na oração. Foi um tempo de muita luta, de discriminação contra a poesia popular, de delegados de pessoa tomando pandeiros de emboladores de coco e furando de faca e querendo cobrar taxas de licença para cantorias de viola. Foi um tempo em que era preciso ir às escolas para mostrar a cantoria de viola e o coco de embolada porque tinha se tornado uma coisa estranha, enquanto a discoteque movida à música estrangeira invadia as cabeças de uma juventude que o sistema precisava alienar da sua cultura para continuar dependente e imobilizada, mesmo depois do fim da ditadura. Estava acabando o tempo do chicote e começando o tempo da invasão dos corações e mentes para submeter a nova geração. Foi um tempo de resistência. Talvez nem tivéssemos a devida dimensão da imensa tarefa de que estávamos imbuídos. Luiz Antônio, não tendo formação de esquerda, mesmo não vindo dos sindicatos ou das bases da Igreja, nem do movimento estudantil, encampou essa luta e colocou sua viola a serviço das lutas populares. É esse Poeta que nos deixa hoje. Seu nome, porém, ficará nas antologias dos bons repentes e seus poemas estão imortalizados nos livros "Luiz Antônio" (que publicamos em 1977, pela Esam) e "Do Sertão Para o Mundo" (publicado depois). Recentemente, por insistência de Gustavo Luz, Luiz vinha escrevendo folhetos de cordel, tendo lançado pela Editora Queima-Bucha, um sobre Jesuíno Brilhante, outro retratando um dos contos populares coletados por Câmara Cascudo e, por fim, um sobre o sal."
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Luiz era muito bom de improviso. No livro Mil estrofes antológicas que estou escrevendo já tenho alguns dos seus improvisos e adianto para os leitores da coluna: Cantando comigo na ESAM numa exposição de flores, chegou o médico Laíre Rosado que ainda não era deputado, mas era presidente de um partido político. Começamos a falar de política, enfocando principalmente os dois candidatos ao governo do Estado, José Agripino e Aluísio Alves. E eu terminei uma sextilha dizendo:
Num eu não tenho esperança, No outro eu não tenho fé
Luiz Antonio fez uma belíssima estrofe dizendo:
Entre Aluísio e José Está a maior revolta.
Um tá atrás do poder;
O outro tem, mas não solta.
Eu troco um pelo outro,
Não quero um tostão de volta!
Mas para encerrar vamos lembrar uma estrofe que ele fez em 1984, quando houve uma batida de automóvel, onde morreu uma senhora e saíram outras pessoas feridas.Quando Luiz ia iniciar um programa de rádio com Francisco Souza, que estava substituindo o colega da Rádio Ouro Branco, chegou o noticiarista com esse assunto extraordinário e eles abriram o programa cantando o assunto.Depois de cantarem bastante Francisco Souza terminou dizendo:
Quando o carro abalroou, uma senhora morreu.
Luiz fez esta sextilha que um colega chamado João Luiz decorou na hora:
Depois que o carro bateu
Se via sangue de ruma;
Mas com morte de acidente
O povo não se acostuma...
Morte só quer a desculpa
Hoje à tarde arranjou uma.
Pois é... A morte arranjou mais uma desculpa para levar nosso poeta..Que Deus o tenha.